Editorial

Rede “social” ?!

Refletir sobre o fundamento e a importância do nosso ser-em-relação e descobrir nos vastos desafios do atual panorama comunicativo o desejo que o homem tem de não ficar encerrado na própria solidão” é a proposta da mensagem recém-publicada do Papa Francisco para o Dia Mundial das Comunicações, a ser comemorado em 2 de junho.

Este ano, a mensagem se debruça uma vez mais sobre a Internet e, de modo particular, sobre as redes sociais. A Igreja e o Papa Francisco reconhecem as imensas contribuições para o progresso e desenvolvimento, as facilidades e vantagens trazidas pela Internet, também no que diz respeito às relações interpessoais. Efetivamente, a Internet é hoje o maior canal de comunicação e o mais importante fator promotor da globalização, com o que esta comporta de bem e de mal. A Internet ultrapassa todas as fronteiras e faz tudo parecer “vizinho”. Como afirma a mensagem, “a rede é o recurso do nosso tempo. Uma fonte de conhecimento e relações outrora impensáveis”.

Se é verdade que a rede constitui uma possibilidade extraordinária de acesso ao saber, de integração entre as pessoas via rede social, “fazendo-nos nos ajudar uns aos outros”, por outro lado, o mau uso desse meio comporta riscos graves: a disseminação em escala global de fake news e mentiras que transformam a rede na maior propagadora de desinformação; o uso manipulador dos dados pessoais visando vantagens político-econômicas sem o devido respeito aos direitos das pessoas; o cyberbullying, que hoje atinge um de cada quatro jovens. Esses são alguns dos exemplos apontados na mensagem. Em um parágrafo, que vale a pena ser lido e refletido, Francisco apresenta concretamente o uso da rede como fonte de propaganda ideológica, de segregação entre grupos e, até mesmo, canal de difusão do ódio entre diferentes agrupamentos:

“No cenário atual, salta aos olhos de todos como a comunidade de redes sociais não seja, automaticamente, sinônimo de comunidade. No melhor dos casos, tais comunidades conseguem dar provas de coesão e solidariedade, mas frequentemente permanecem agregados apenas indivíduos que se reconhecem em torno de interesses ou argumentos caraterizados por vínculos frágeis. Além disso, na social web, muitas vezes a identidade se funda na contraposição ao outro, à pessoa estranha ao grupo: define-se mais a partir daquilo que divide do que daquilo que une, dando espaço à suspeita e à explosão de todo tipo de preconceito (étnico, sexual, religioso e outros). Esta tendência alimenta grupos que excluem a heterogeneidade, alimentam no próprio ambiente digital um individualismo desenfreado, acabando às vezes por fomentar espirais de ódio. E, assim, aquela que deveria ser uma janela aberta para o mundo, torna-se uma vitrine onde se exibe o próprio narcisismo”.

O Papa apresenta alguma solução para tais riscos?

A resposta é sim e tem a ver com RESPONSABILIDADE PESSOAL. “Se aos governos cabe buscar as vias de regulamentação legal para salvar a visão originária duma rede livre, aberta e segura”, cabe a cada um de nós a escolha responsável para usá-la positivamente. Em realidade, as mesmas regras éticas que, no “mundo real”, por assim dizer, regulam as relações humanas de modo a garantir a paz, a justiça, o respeito à dignidade humana e a estabilidade social, também valem com maior rigor para as redes sociais do “mundo virtual”. Em realidade, o impacto das redes sociais no dia a dia das pessoas é tão grande, que as próprias terminologias “mundo real” e “mundo virtual” não fazem mais sentido. O espaço cibernético é parte do mundo real.

Em sua mensagem, o Papa aplica a metáfora paulina do corpo com seus membros, que o Apóstolo usa para ilustrar o mistério da Igreja e a relação de reciprocidade entre os fiéis, fundada num organismo que os une, e estende esse princípio a toda a sociedade humana: ser-em-relação significa ser membros uns dos outros, e “o fato de sermos membros uns dos outros é a motivação profunda a que recorre o Apóstolo para exortar a despir-se da mentira e dizer a verdade: a obrigação de preservar a verdade nasce da exigência de não negar a mútua relação de comunhão”.

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