Editorial

A Democracia em Risco

Quase tudo se é possível conseguir com a boa manipulação da Constituição Brasileira”. A fala é do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Roberto Barroso, no dia 10 de março de 2015, quando palestrou sobre ativismo judicial e judicialismo no Centro Universitário de Brasília. Dentre suas falas, destaca-se também a posição sobre as “decisões criativas” do Judiciário: o ministro considera que a legitimidade ou não dessas decisões depende apenas da capacidade do Supremo de encontrar, na Constituição e na retórica, justificativas convincentes. 

Um exemplo das “decisões criativas” defendidas pelo ministro Barroso é o que ocorreu no final do ano passado, quando a Primeira Turma do STF revogou, baseada em voto escrito por ele, a prisão preventiva de cinco pessoas, entre médicos e enfermeiros, que foram presas em flagrante ao administrar uma clínica clandestina de aborto. O Ministro considerou que deveria soltá-los, pois, apesar do Código Penal considerar o aborto como crime contra a vida humana, impedir a interrupção da gravidez, por qualquer motivo, até o terceiro mês, é – segundo Barroso – uma violação de vários direitos fundamentais da mulher, além de ser contra a integridade física e psicológica da gestante. 

Esses são os motivos que se vê no discurso pró-aborto. São motivos ideológicos – e não motivos legais. Se o Judiciário deixa de aplicar a lei e passa a impor “decisões criativas”, de forma a abrir novos precedentes legais, ele não está mais exercendo seu papel: ele usurpa o lugar do Legislativo. Quando o Supremo tem o poder de criar, vetar e aplicar leis, perde-se um dos pilares da democracia: a garantia de que nenhum dos três Poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário - será dotado de autoridade absoluta sobre os demais. 

Outro ministro do Supremo, Luiz Fux, compartilha da opinião Barroso: em 5 de dezembro de 2016, no 10° Encontro Nacional do Poder Judiciário, Fux disse que o STF, quando age no lugar do Parlamento e toma decisões sobre temas polêmicos como o do aborto, apenas responde a uma demanda popular que o Congresso, omisso, ignora por medo das consequências. De acordo com Fux, neste tipo de situação é legítima a intervenção do STF, pois os ministros, não sendo eleitos, têm maior independência e não devem, “depois da investidura, satisfação a absolutamente mais ninguém”. 

Entretanto, é justamente por não serem eleitos que os ministros não podem tomar tais decisões. Cabe ao Legislativo fazer leis já que, em tese, ele deve responder ao povo que o elegeu; e se mais decisões não são tomadas a favor do aborto, é porque o povo brasileiro não as quer: diversas pesquisas demonstram que a grande maioria dos brasileiros é contrária à legalização do aborto. 

A demanda pelo aborto, portanto, não vem do povo, mas de grupos ideológicos e, para atendê-la, o Supremo se dispõe à “boa manipulação da Constituição Brasileira”, o que é, sob todos os aspectos, inaceitável.
 

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