Fé e Cidadania

O rico e o Lázaro

Na impressionante cena do Juízo Final fica expresso o critério pelo qual seremos, todos, examinados (Lc 16, 19-31). Esse critério, resume e sintetiza São João da Cruz, é o amor, pois precisamente do amor pelos pobres trata o conhecido relato de Jesus em que se colocam em confronto a situação da mais extrema pobreza e a da mais remata opulência.

É conhecida a primeira recomendação que um prelado emérito de nossa cidade fez ao Papa Francisco quando este foi elevado ao Sumo Pontificado: não se esqueça dos pobres.
Tal critério elementar de compreensão foi adotado, agora mesmo, pelo Papa ao instituir o Dia Mundial dos Pobres, que será comemorado, pela vez primeira, em 19 de novembro.
Na significativa mensagem que preparou para essa data, o Papa afirma categoricamente: os pobres não são um problema!

Em verdade, os pobres desvelam que o problema está no acúmulo de bens nas mãos do rico epulão. Este não quer repartir nem ao menos as migalhas que sobejam de sua rica mesa.

Por consequência, vai sendo criado o imenso abismo que a parábola explicita para depois da morte, mas que nós identificamos, claramente, na vida corrente. Abismo que também separa, como assinalou a Gaudium et Spes, os povos da fome dos povos da opulência.
Poderemos prosseguir convivendo com a brutal desigualdade econômica e social que confere a 1% da população mundial o mesmo tanto de bens que aos 99% restantes? Esses dados foram coligidos pela insuspeita Oxfam, entidade de grande prestígio internacional.

Em um dramático apelo, que bem pode ser considerado a verdadeira chave da questão social destes tempos pós-modernos, o Papa sublinha o problema na Evangelii Gaudium.
A necessidade de resolver as causas estruturais da pobreza não pode esperar; e não apenas por uma exigência pragmática de obter resultados e ordenar a sociedade, mas também para curá-la duma mazela que a torna frágil e indigna e que só poderá levá-la a novas crises.
Já há bastante tempo foi proposta uma solução preliminar, simples e prática, consistente no estabelecimento da Tobin Tax, a ser cobrada em alíquota mínima sobre todas as transações financeiras internacionais, cujo inteiro aporte seria destinado à erradicação da pobreza.

Os povos da fome, notadamente os mais pobres, poderiam contar com substancial ajuda de projetos, que, submetidos ao crivo de especialistas, cooperassem na superação da miséria e da opressão.
Enfim, o rico destinaria a migalha ao pobre e, quem sabe, não começaria a construir a ponte que lhe faria superar o abismo até agora criado.

Wagner Balera é professor titular de Direitos Humanos na Faculdade de Direito da PUC-SP e conselheiro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP

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