Fé e Cidadania

A chaga do desemprego

No contexto provocado pela crise mundial, assume particular relevo a chaga do desemprego (expressão forte de São João Paulo II, na Laborem Exercens , 1981, nº 8). 

De fato, esse dado alarmante está inserido na configuração econômica mundial dos últimos decênios. Essa chaga pode ter sido o motor da crise ou, até mesmo, o primeiro sinal de que as coisas não caminham muito bem. 

Há duas maneiras de se refletir sobre o tema. 

Poderíamos entender a crise como fenômeno conjuntural, apto a impor aos povos certas restrições que, em breve, desaparecerão. Ou, como também se cogita, a crise pode ter vindo para ficar, porque significa quase que um rearranjo das camadas profundas da economia. 

Já se considerarmos o tema sob o enfoque puramente econômico, concretiza-se, a olhos vistos, o processo de globalização das economias, ditado pelas corporações transacionais que, detentoras do capital e das riquezas, elegeram o predomínio das regras do mercado; a garantia da livre concorrência; e o respeito absoluto aos contratos (ainda que se trate de contratos leoninos) como a “constituição” do mundo sem fronteiras. 

A crise mundial põe em pauta o mais social de todos os riscos: o desemprego. 

Além das conhecidas formas de desemprego sazonal e friccional, que certamente seguirão existindo na aldeia global, o fenômeno do desemprego estrutural irá impor redução permanente dos postos de trabalho em todo o mundo.

Registra a Organização Internacional do Trabalho que já são 200 milhões de desempregados no mundo, e que esse número cresce à razão de 2 milhões por ano. 

Esse dado, no entanto, corresponde só  a parte do quadro. São milhões de milhões aqueles que nunca obtiveram posto formal de trabalho, que nem mesmo figuram em qualquer estatística. 

Decerto, essa chaga, ao se alastrar, acirra a questão social e provoca como resultados os fenômenos da fome, da mortandade, da criminalidade...

O que provoca essa chaga? Segundo São João Paulo II, na base da economia contemporânea e da civilização materialista, há uma falha fundamental ou, melhor dito, um conjunto de falhas ou até um mecanismo defeituoso, que não permite à família humana sair de situações tão radicalmente injustas. ( Dives in Misericordia , 1980, nº 11). 

Que a comunidade mundial volte a pôr em pauta a instauração urgente de uma nova Ordem Econômica Internacional, que há mais de 40 anos a ONU vem propondo e adiando. 

Não é possível que tarde essa remodelagem da economia a fim de que o exercício do trabalho seja possível a todos.

 
As opiniões da seção “Fé e Cidadania” são de responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, os posicionamentos editoriais do O SÃO PAULO.
 

 

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