Editorial

Tempos estranhos

“Tempos estranhos” é expressão habitualmente utilizada por Marco Aurélio Mello, Ministro do STF. Ainda que haja divergências com votos e decisões do ilustre Ministro, é preciso reconhecer que existe muita verdade na expressão, ainda mais apropriada nesta semana que se passou, quando o STF começou a julgar a Constitucionalidade do Ensino Religioso nas Escolas Públicas. 

A Constituição Brasileira, lei máxima do País, em seu art. 210, estabelece que é dever das Escolas Públicas oferecer o Ensino Religioso, porém ao aluno a matrícula será facultativa (opcional). Foi vontade da população, expressa na Constituição, não fazer violência às consciências, permanecendo garantida a liberdade de escolha religiosa daqueles que por opção não queiram assistir a tais aulas, sem ônus ou prejuízos curriculares. Apesar da clareza do texto constitucional de 1988, logo após a publicação do Acordo Internacional firmado entre Brasil e Santa Sé (11 de fevereiro de 2010), a procuradora em exercício à época, Sra. Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, em 30 de julho de 2010, ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI/4439) no STF, com o pedido que sejam abolidos temas religiosos do conteúdo das Aulas de Ensino Religioso. Em seu lugar, propõe a ilustre procuradora, que se ministre outros conteúdos, dentre eles, o “Ateísmo e Agnosticismo”, conforme pág. 03 da citada ação. 

Os pedidos feitos na ação atacam frontalmente a vontade constituinte, que é a materialização legal da vontade da maioria da população. Com efeito, vale destacar que o Acordo Brasil-Santa Sé apenas reafirma o que já está estabelecido na Constituição Brasileira, bem como o que regula a Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional, que estabelece, em seu art. 33 § 2º (acrescido pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997), que será função das entidades civis, composta pelas diferentes denominações religiosas, definir o conteúdo do Ensino Religioso. Está claro que todas as possibilidades já foram tratadas pelo Legislador, que é quem tem o dever constitucional de tratar do tema. Não cabe ao Judiciário legislar, pois esta não é sua função. Cumpre ao STF salvaguardar a Constituição de iniciativas como essa, dando a correta interpretação do texto constitucional.

Não sem demora, também há que se dizer que seria de bom alvitre que o Ministro Luís Roberto Barroso, relator da ação no STF, se declarasse impedido do julgamento, uma vez que a ação segue acompanhada de representação feita pelo Dr. Daniel Sarmento, amigo de longa data do ilustre magistrado. 

Ao STF, que iniciou esse julgamento no último dia 30/08/2017, se apresentam duas alternativas: a primeira é julgar-se superior aos legisladores, dando uma interpretação esdrúxula ao texto constitucional; a segunda é cumprir com o Art. 102 da CF/88, que define como primeira função do Supremo a guarda da Constituição. Em cumprindo o seu papel, o Ensino Religioso nas escolas públicas estará a salvo: assim desejamos, assim esperamos que seja.
 

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