Bioética e defesa da vida

Liberdade de escolha e dilemas éticos

A paixão pela liberdade é um aspecto muito positivo da cultura contemporânea. Afinal, se não fôssemos livres, não poderíamos amar. A liberdade, bem orientada, revela o melhor de cada um de nós.

Porém, a cultura contemporânea é também influenciada por correntes de pensamento que confundem a liberdade com uma espécie de impulso arbitrário. A lógica é simples: o prazer nos satisfaz, é útil; devemos honrar nossos desejos, pois somos livres.

Porém, é preciso refletir sobre as consequências das escolhas na vida pessoal e na vida social, pois o ser humano vive em sociedade. E nesse contexto de valorização da liberdade – mesclada com as máximas do individualismo e do hedonismo -  alguns temas presentes no debate público ganham contornos polêmicos e polarizados. Tudo depende da noção de liberdade de escolha.  

Afinal, a liberdade de escolha é soberana?

As pessoas, de modo geral, baseiam suas opiniões e escolhas nas informações disseminadas pela grande mídia. Os meios de comunicação, contudo, tendem a retratar os assuntos – quaisquer que sejam as suas nuanças - a partir de uma perspectiva dualista, binária e simplória: liberal versus conservador, flexível versus intolerante, vítima versus opressor. Além de inconsistentes, tais dicotomias negligenciam aspectos fundamentais para o entendimento da realidade.

Constata-se, por exemplo, que no debate de temas como o aborto, o soberano argumento da “liberdade de escolha” desqualifica antecipadamente posições contrárias, como se essas fossem de per si intolerantes ou fanáticas. Os mais prejudicados por essa pobreza de argumentação são as próprias mulheres, até mesmo adolescentes, que carecem de informações precisas para tomarem decisões melhor fundamentadas, não precipitadas. As consequências físicas e psíquicas do aborto, para a mulher que o pratica, estão documentadas. O peso da cultura machista, o abandono, que pressiona e induz ao aborto, é fato notório, reforçado e facilitado pela legislação permissiva do aborto. A morte de seres humanos inocentes é real. Porém, não há debate. 

Outro exemplo ilustrativo é a discussão atual sobre pessoas transgêneras – i.e., que não se identificam com seu sexo biológico. Por um lado, há o argumento de que o indivíduo é livre para decidir o que fazer com seu corpo. Porém, a Universidade John Hopkins (Boston), que há 20 anos foi pioneira nessas cirurgias abandonou a prática. Por quê? As mesmas trazem consequências físicas e psíquicas irreversíveis, e os distúrbios emocionais anteriores não eram aliviados por elas. Constatou-se alto índice de suicídio entre as pessoas que a elas se submeteram. Além disso, em se tratando de crianças, pesquisas científicas apontam que a maioria daquelas identificadas com “disforia de gênero” não continuam com o transtorno após a puberdade. Tais pesquisas e experiências mereceriam entrar no debate, mas de fato não é assim. Tudo se simplifica com o respeito à “liberdade de escolha”, inclusive a infantil. Será mesmo livre uma escolha tão mal informada? A sábia sentença evangélica adverte: “a verdade vos fará livres”.

Em suma: esquivar-se de pensar e prescindir da análise das consequências pessoais e sociais de uma escolha significa não desejar - de fato – a liberdade, e sim o exercício de um mero arbítrio irrefletido.  

Verdade e liberdade

A verdadeira liberdade pressupõe o acesso a informações e a oportunidade de uma reflexão fundamentada e ponderada sob os diversos ângulos, tão ricos, que a realidade humana oferece. A dignidade inerente à pessoa humana só é assegurada levando-se em conta seus aspectos biológico, psicológico, social e espiritual. E só seguindo essa pista a legislação poderá efetivamente promover o “bem comum”, isto é, aquele conjunto de condições que permitam e favoreçam o desenvolvimento integral da pessoa humana.  

São João Paulo II em sua memorável encíclica Fides et Ratio convidava todos a refletirem profundamente sobre o homem, e sobre a sua busca constante de verdade e de sentido. Só neste horizonte da verdade – dizia o Papa -  poderá compreender, com toda a clareza, a sua liberdade e o seu chamamento ao amor.

Para pesquisar, digite abaixo e tecle enter.